A etimologia da palavra dicotomia vem do grego, dikho (dois) e tomia (cortar). Portanto, quer dizer: cortar em duas partes (iguais).

Daí se evoca a ideia de dualidade, oposição, divisão etc., e seu uso comum na formatação de raciocínios que se expressam na simplicidade das falas e nas concepções do cotidiano, em seus diversos contextos: dia e noite (astronomia), vida e morte (religião), bem e mal (filosofia), esquerda e direita (política), pessoal e profissional (sociais aplicadas) etc.

Pensamos em categorias porque é mais fácil para ensinar e aprender. Como recurso didático, facilita entendimento e é de fácil “checagem”. Lembra aquele conceito de que quando algo é muito complexo, convém dividi-lo em partes menores para acelerar a compreensão, dominá-lo e depois, exponenciá-lo?

Mas em termos práticos e operacionais não é tão fácil nem tão linear assim.

Aprovado ou reprovado. No ensino tradicional, cada matéria é ensinada com total independência de outra. Aliás, é tão assim que as avalições são por disciplina (português, matemática, geografia, historia, artes, educação física…) e é plenamente possível alguém ser reprovado e ter que cursar tudo de novo, porque teve notáveis 10 em todas as matérias, menos uma — o que lhe custa um reprovação geral.

No senso comum, muitas pessoas acreditam que o modelo deve ser assim mesmo — afinal as regras estão escritas! Mas há quem ouse a pensar em modelos alternativos avaliação da aprendizagem.

Mas essa é outra historia…

Quero apenas considerar o quanto a noção dicotômica distorce realidades e impede possibilidades.

Já percebeu no mundo das transformações organizacionais o quanto de energia se perde na defesa de purismos metodológicos, inadaptabilidade de frameworks e na repetição de dogmas?

A questão não é demonizar ou argumentar contra a discussão sobre modelos, métodos ou abordagens, mas é sobre ampliar a consciência e admitir que as diversas camadas de realidades coexistem em perspectiva sistêmica diante do nível de complexidade que a sociedade atual atingiu.

Pensando em flexibilidade e abertura, considero ainda a Falsa Dicotomia.

Ela parte de uma falácia, da ideia equivocada e restrita de que existam apenas duas posições antagônicas. Na verdade há muito mais caminhos. Apenas não foram descobertos porque não foram pensados.

Antes de ser psicanalista em tempo integral, atuei muitos anos no mercado financeiro. Lembro-me de ter sido alvo de uma falsa dicotomia. Havia recebido um convite para lecionar numa universidade. Feliz, compartilhei a notícia com meu diretor e ouvi:

– Ou você está integralmente comigo, ou está em sala de aula. E quando tiver reunião? E quando precisar de você?

Deu trabalho para desconstruir nele, aquele pensamento falsamente dualista. Tive que “desenhar” e por fim entendeu que eu daria aula apenas uma vez por semana e que em nada atrapalharia minhas entregas e permanência no jogo.

De fato, terceiras e quartas vias foram construídas sem prejuízo algum. Tempos depois, além de ser professor, também atendia pessoas em meu consultório.

A proposta para o tempo atual é abandonar o pensamento dicotômico, e de fato, começar a pensar e agir em categorias integrativas, interativas, compartilhadas, e ecossistêmicas — múltiplas e infinitas.

Este pensamento tem norteado minha atuação clínica no acompanhamento de muitos profissionais em sofrimento por causa um jeito dicotomicamente inconsciente de pensar.

Marcos Wagner, Psicólogo clínico e Partner habilitador de ambientes seguros na We Head.

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